A cabeça de cada um funciona de um jeito em cada tipo de situação.
Em situações de pânico, geralmente tendo a pensar que alguém ali precisa raciocinar de forma lógica (e na maioria das vezes tento ser esta pessoa).
Nos momentos de isolamento, é onde mora meu problema. Viro quase que um Clóvis de Barros, ou um Mário Cortella guardadas as óbvias proporções. Sempre que estou no meu canto, começo a pensar em muita coisa, mas uma que é mais latente é a questão de onde eu quero chegar ou se eu já cheguei lá e não percebi ainda.
Nasci em família humilde, pai operário da indústria de calçados, mãe lavadeira de roupas, e pelo simples fato de revisar a minha trajetória e a de meu irmão, comparando com outras pessoas que conviveram conosco em especial na juventude / adolescência, estamos ótimos. Mas, e aquela voz que sussurra desde menino que, se eu não quisesse passar pelo que seus pais passavam, eu não poderia parar e principalmente não poderia errar? Trabalho desde os 12 anos, não comecei antes por um problema de saúde, e meu irmão se não me engano, desde os 8 ou 9 anos.
Nunca foi fácil. E não acho que isso tenha sido negativo não. Eu paro para pensar hoje, e lembro de situações que vivi, e percebo que elas me construíram de forma reversa. Hoje por exemplo, ocupo um cargo de liderança, e tudo o que eu passei de problemas, de atropelos com lideranças que tive, me esforço para fazer o contrário e por aí vai. Com certeza não devo ter conseguido fazer tudo de forma ótima. Mas, acho que tenho me empenhado para chegar lá, sem machucar ninguém, e sem cortar nenhum caminho.
Dentro do que me moldou, existe em mim, valores que são inegociáveis, que meus pais me ensinaram desde moleque, que são a honestidade, o trabalho duro, e etc. Na lógica disso, vem o sucesso. Certo? Vou chegar lá, ok?
Onde é lá? E lá, é onde mora o sucesso, a felicidade e etc.?
Antes de responder, vou andar alguns poucos anos atrás: eu treinava judô em um clube, que, infelizmente, as condições não eram as melhores. O tatame com rasgos, sempre tudo sujo, o banheiro do lado sempre com mal cheiro, se chovia enchia de goteiras e etc. Mas, sempre estava lá nosso sensei. Com apenas dois alunos. Eu, e um colega. Quanto pagávamos por mês? R$ 70,00. Isso não faz dois anos. Para terem uma noção, uma academia cobraria cerca de R$ 250,00 mensais.
Um dia conversando com o nosso sensei, que aliás era mais jovem que nós, nos contava que morava do outro lado da cidade de São Paulo, dava aulas durante a manhã em outra região, a tarde, aulas de pilates e a noite conosco, chegava correndo, suado, vindo do metrô para nos dar a aula. Eu e meu amigo quando perdemos dois outros amigos que treinavam com a gente, pensamos: “-não é justo que paguemos só R$ 70,00, vamos propor um reajuste a ele”. Ele ficou surpreso, aceitou mas percebemos que aquilo para ele foi recebido como um gesto de gratidão nosso, e não como um equilíbrio econômico como havíamos pensado que seria. Daí, aos poucos fomos conversando nos finais dos treinos, e etc, quando começamos a perceber que, sempre que falávamos com ele, ou com a esposa dele, também sensei, que ia vez em quando aos nossos treinos, a simplicidade era algo muito grande neles, e eles eram extremamente felizes daquela forma. A sensação que eu e meu amigo tínhamos era que, aquilo bastava para que fossem felizes. Eles não queriam estar nas grandes academias, serem os melhores senseis e etc. Não. Eles queriam ser professores, passar seus ensinamentos, e viver felizes. Se isso é uma falsa sensação que tivemos ou não, eu acho que nunca vou saber. Talvez eu um dia possa ainda perguntar para eles sobre isso.
Mas daí vem a resposta da pergunta que fiz antes sobre o sucesso, sobre chegar lá e etc. Pode ser que você já tenha chegado e continua com uma obsessão gigante em querer chegar onde você não tem que estar. Não que não mereça.
O que isso tem a ver com os valores que comentei ter recebido de meus pais? Tudo. Eu costumo brincar que todos possuem histórias, e que alguma não contamos por vergonha boba, ou por vergonha profunda. Ou até, por medo de contar a verdade. Já ouvi me dizerem que, “-não se importam em pagar o dinheiro que pegaram no banco, porque o banco é rico e ele não”; sair do trabalho em que estava, criar uma série de provas, processar o antigo trabalho, ganhar uma super indenização – se é devido o processo não sou contra – ou; até mesmo na profissão que eu atuo – compras – inúmeros casos que infelizmente acontecem de pessoas que recebem dinheiro que não é seu e etc. Para que? Para chegar lá.
Concluindo, “lá” pode ser o que você tem hoje. Viva como meu sensei: sorrindo, contando histórias, e passando para frente o que sabe. Pode ser que o “lá” que você quer, te faça ultrapassar barreiras que não deveria, e nem é “o seu lá”.